O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Gratidão e paz — Familiares diversos


Capítulo 1


Inês Severo Ruivo


“MINHA GRAVIDEZ ERA UM ACONTECIMENTO MAIS NA ALMA QUE NO CORPO”

Quando viajava de automóvel, com seu marido, pela Rodovia Presidente Castelo Branco, voltando de Penápolis com destino a Cubatão, SP, a senhora Inês foi acidentada gravemente. E, embora transportada, de imediato, para São Paulo, veio a desencarnar no Hospital das Clínicas, no dia 2 de novembro de 1971.

Naquela época ela esperava o primeiro filho, estando grávida de seis meses, e o aborto foi inevitável, fato que, evidentemente, agravou a dor da família.

Cinco anos após esse acontecimento, Inês regressou, em Espírito, em longa e esclarecedora mensagem, pela psicografia de Chico Xavier, recapitulando detalhes do “calvário da separação”, “trazendo um grande conforto, paz, tranquilidade e fé de volta ao lar”, no dizer de seus pais.

Um ponto alto e belíssimo da carta é o relato de sua ligação amorosa e espiritual ao Espírito de seu filho, após a desencarnação de ambos, afirmando: “Minha gravidez era um acontecimento mais na alma que no corpo.”




1 Querida mamãe, meu querido papai, abençoem a filha que volta.

2 Fui trazida até aqui e ouvi o que falaram sobre suicídio. Esse assunto, mamãe, é a ideia que me impulsionou a trazer-lhes os meus testemunhos de saudade e reconhecimento.

3 O Finados de 1971 parece tão longe e a nossa dor parece recente. Ferida de hoje, golpe aberto no coração no instante em que escrevo. Mas não falo nisso sem as orações de esperança.

4 Quase cinco anos alteraram muitos quadros da vida, menos os nossos. É por isso que falo em sofrimento como sendo sofrimento presente. Creiam, porém, que tenho melhorado e encontrado uma visão diferente da vida.

5 Mamãe, eu sei o que tem sido esse calvário de separação para nós. Cada dois de novembro é um degrau de lágrimas, que atravessamos juntas. Eu sei que a própria dor do papai ficou mais pesada em seu carinho, mas pode estar certa de que se uma filha pede a Deus recursos para ser grata, estou entre essas que reconhecem nas mães as benfeitoras de cada dia.

6 Venho pedir à senhora e ao meu pai para que não pensem na morte. É preciso que vivam e que vivam fortes e felizes. 7 Árvores queridas, em cuja ramaria de ternura fizemos tantos ninhos de esperança, a tempestade das provas poderá sacudir-lhes as forças e despojá-los de muitas alegrias, mas continuarão de pé, aceitando a vontade de Deus que nos deu a felicidade de pertencer-lhes.

8 Haverá, sim, mãezinha, aguaceiros de pranto e ventanias de adversidades, como tem havido sobre nós, mas Deus nos fará ver de novo o céu azul e outras flores surgirão de nossas preces, para que a nossa felicidade seja sempre esse cântico de amor que nunca esmoreceu em nossa fé.

9 Perdoem-me se lhes deixei tantos encargos. Não pensava que o fim do corpo estivesse ali, naquela noite em que o nosso carro voltava de Penápolis.

10 Havia chorado tanto, lembrando a vovó Elídia, havia pensado tanto em mostrar-lhe as minhas preces de saudade, mal sabendo que naquela mesma data em que lhe recordávamos a partida dez dias antes, no entanto, não pensava, seria eu a primeira a unir-se-lhe aos passos.

11 Não pensem que houve culpa do José. Estávamos tranquilos. Parece-me que a sombra criou o problema, de vez que ele faria tudo para que nada de mal nos acontecesse.

12 Quando caí, tive a ideia de que perderia a consciência, mas isso não aconteceu. 13 Aqui, meu bisavô José Severo e alguns amigos, dentre eles o Padre Primo, me esclareceram que a minha gravidez era um acontecimento mais na alma que no corpo. 14 Teria perdido a criança para a consideração dos médicos; entretanto, meu filhinho estava em mim, era meu, uma criaturinha de seis meses completos, que eu não poderia abandonar.

15 Mamãe, tudo parece triste, mas esses fatos mostram a beleza do amor. Enquanto me senti espiritualmente ligada ao Espírito de meu filhinho, não pude perder a lucidez do que se passava.

16 Sei que um carro ou ambulância me carregou para as Clínicas e chamei por você, mamãe, como quem chamasse por Nossa Senhora. Mas não era aguardando um milagre.

17 Eu sabia que tudo estava terminando, mas nas minhas ilusões de mãe, muito moça, pensei que minha criança estivesse vivendo e queria entregá-la em suas mãos.

18 Aqui, no entanto, pouco a pouco, tudo entendi. Penso hoje que não será fácil morrer no corpo, como nascer das mães que adoramos. 19 Muitos dizem que foram anestesiados no momento da desencarnação, que nada viram e que apenas acordaram numa Vida Melhor.

20 Creiam, porém, que as mães grávidas e que deixam a existência na Terra nessa condição, não conseguem dormir, até que a Bondade de Deus lhes faça sentir que os filhinhos não nascidos encontraram quem os proteja e os ame.

21 Tudo passou. Agora é a paz da certeza de que não nos separamos. Custei algum tempo a recuperar-me do tratamento a que me submeteram. 22 Não posso deixar de dizer à senhora e ao papai que recebi a assistência que se deve à mulher quando vítima de aborto de grave situação.

23 Quando melhorei, escutei suas preces e seus pedidos a Deus. Sem poder fazer alguma coisa, rezei também, pedindo a Deus para consolá-los. Peço-lhes para estarem confiantes em Deus.

24 Meu avô José Severo e minha avó Maria velam por mim. A vovó Elídia, que chegou aqui vitoriosamente, depois das provas atravessadas, é hoje para mim igualmente um valioso apoio. Ela e a irmã Sinhazinha, amiga de Barretos e Guaíra, me ampararam igualmente nas horas mais complicadas.

25 Mãezinha e papai, lembrem Eliana, Paulo César, Inês Rosemeire e pensem como precisamos da saúde para trabalhar por eles todos. E lembro aqui o José Severo, a Angélica, a Marinês, a Priscila, o Edson e tantos outros amores que temos e que Deus nos concedeu para zelar.

26 Quanto ao José Jaime, peçamos a Deus para protegê-lo. Desejo que ele seja amado também como filho. Ele não teve culpa alguma naquela ocorrência em que as leis de Deus se cumpriram. Ele sempre foi bom, amigo, dedicado e sincero. Está moço, mamãe, seu filho, o filho que lhe deixei com o nome de genro e que precisa de muita assistência e de muito amor.

27 Daqui, trabalharei para vê-lo feliz. Posso ainda tão pouco. Às vezes, em nossa casa da Quinze de Novembro, choro ao pensar que desejo auxiliar tanto e posso ainda tão pouco.

28 Mas nossa fé não esmorece nunca. Aquela confiança que a senhora e meu pai nos deram em casa está comigo. Com essa luz, caminho para a frente e seguirei adiante, certa de que Jesus tomará minhas mãos, pobres, pelos Mensageiros d’Ele, a fim de que meus braços fiquem fortes.

29 Mãezinha e querido papai, recebam minha alma reconhecida. Estou feliz, porque sei que de agora em diante, estarão acreditando que não morri. A todos os nossos, as minhas muitas lembranças. A todos, agradeço e peço perdão por haver esquecido nomes de família que não devia esquecer. Todos, porém, sabem que sou grata e que sou a irmã devedora de cada um.

30 Querido papai, peço-lhe forças novas, mãezinha querida, rogo-lhe coragem e fé, cada vez mais viva em Deus. Não suponham que escrevi sofrendo. Chorei em alguns trechos de minha carta, porque Deus perdoa a saudade quando as nossas saudades são de alegrias de reencontro na gratidão perante os Céus.

31 Estou melhorando, e ficarei plenamente feliz ao vê-los mais reanimados e mais felizes.

32 Agora termino, com o beijo para os dois. Abençoem-me.

33 Lembrem-me com as preces. Não me creiam ausente. Estamos sempre mais juntos.

34 Para o senhor, querido papai e para você, mãezinha querida, todo o coração com os agradecimentos da filha que estará sempre entre ambos, pedindo a Deus para conservar-nos em seu amor. Abraços, muitos abraços, beijos e muitos beijos da filha reconhecida, sempre mais reconhecida,


Inês


Notas e Identificações

1 - Carta psicografada em reunião pública do Grupo Espírita da Prece (GEP), Uberaba, MG, na noite de 21/5/1976.

2 - Mamãe, papai — Casal José Severo da Silva Netto e Alcina de Souza Silva, residente à Rua XV de Novembro, 121 — Vila Nova, Cubatão, SP.

3 - Finados de 1971 — Data de sua desencarnação.

4 - Vovó Elídia (…) lhe recordávamos a partida dez dias antes — De fato, Dª Elídia, sua avó materna, desencarnara dez dias antes de sua passagem, aos 23/10/1971.

5 - José — José Jaime Ruivo, esposo.

6 - Bisavô José Severo — Bisavô paterno, desencarnado.

7 - Padre Primo — Padre já desencarnado, amigo íntimo da família Ruivo.

8 - “Teria perdido a criança para a consideração dos médicos; entretanto, meu filhinho estava em mim, era meu, uma criaturinha de seis meses, completos, que eu não poderia abandonar”. — No Mundo Maior, Inês sentia-se ligada ao Espírito (e corpo espiritual) do filhinho, fato possível pois desde a concepção há união do Espírito, que reencarna, ao novo corpo, e, concomitantemente, uma união magnética, mãe-filho, mais ou menos forte, de alma a alma. (Ver O Livro dos Espíritos, Kardec, questões 344 a 360; Missionários da Luz, Espírito André Luiz, F. C. Xavier, FEB, cap. 13; e Quem São, Espíritos Diversos, F. C. Xavier, Elias Barbosa, IDE, cap. 17 e 18.)

9 - Avó Maria — Bisavó materna, desencarnada

10 - “Ela e a irmã Sinhazinha, amiga de Barretos e Guaíra” — A família não se recorda dessa amiga da vovó Elídia.

11 - Eliana, Paulo, Inês Rosimeire, José e Edson — Irmãos.

12 - Angélica — Cunhada.

13 - Marinês e Priscila — Sobrinhas, nascidas em 1975/76, ou seja, após a sua desencarnação.

14 - Inês — Inês Severo Ruivo nasceu em Promissão, SP, a 26/10/1946. “Trabalhou no Banco Itaú e Câmara Municipal de Cubatão, onde deixou muitos amigos e muitas saudades pelo seu jeito alegre, otimista, simpático e sempre muito humilde para com todos. Durante sua breve passagem nesta vida, deixou-nos um vazio que até hoje não conseguimos preenchê-lo, pois a saudade é um sentimento profundo, difícil apagar.” (Declaração de seus pais, em carta de 1º/7/1988.)


Hércio Marcos C. Arantes


Texto extraído da 2ª edição desse livro.

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