O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano III — Outubro de 1860.

(Idioma francês)

DISSERTAÇÕES ESPÍRITAS.

Recebidas ou lidas na Sociedade por vários médiuns.

Marte.

(Méd. Sra. Costel.)

Marte  †  é um planeta inferior à Terra, da qual é grosseiro esboço; não é necessário habitá-lo. Marte é a primeira encarnação dos mais grosseiros demônios. Os seres que o habitam são rudimentares; têm a forma humana, mas sem nenhuma beleza; têm todos os instintos do homem, sem a nobreza da bondade.

Entregues às necessidades materiais, comem, bebem, batem-se, acasalam-se. Mas como Deus não abandona nenhuma de suas criaturas, no fundo das trevas de sua inteligência jaz latente o vago conhecimento de si mesmos, mais ou menos desenvolvido. Esse instinto é suficiente para torná-los superiores uns aos outros e preparar a eclosão para uma vida mais completa. A deles é curta como a dos insetos efêmeros. Os homens, que são apenas matéria, desaparecem após curta evolução. Deus tem horror ao mal e só o tolera como servindo de princípio ao bem. Ele abrevia o seu reino, sobre o qual triunfa a ressurreição.

Nesse planeta a terra é árida; pouca verdura; uma folhagem sombria, que a primavera não renova; um dia igual e cinzento. Apenas aparente, o Sol jamais prodigaliza suas festas; o tempo escoa monótono, sem as alternativas e as esperanças das novas estações; não é inverno, não é verão. Mais curto, o dia não é medido do mesmo modo; a noite reina mais longa. Sem indústria, sem invenções, os habitantes de Marte consomem a vida à procura de alimento. Suas grosseiras habitações, baixas como um casebre, são repugnantes pela incúria e pela desordem que nelas reinam. As mulheres se destacam sobre os homens; mais abandonadas, mais famélicas, não passam de suas fêmeas. Têm apenas o sentimento maternal; dão à luz com facilidade, sem nenhuma angústia; alimentam e guardam seus filhos a seu lado, até o completo desenvolvimento de suas forças, e os expulsam sem pesar e sem saudade.

Não são canibais; suas contínuas batalhas não têm outro objetivo que não seja a posse de um terreno mais ou menos abundante em caça. Caçam nas planícies intermináveis. Inquietos e instáveis como os seres desprovidos de inteligência, deslocam-se incessantemente. A igualdade da estação, a mesma em toda parte, comporta, em consequência, as mesmas necessidades e as mesmas ocupações; há pouca diferença entre os habitantes de um e de outro hemisfério.

Para eles a morte não representa nenhum pavor ou mistério; consideram-na apenas como a putrefação do corpo, que queimam imediatamente. Quando um desses homens vai morrer, logo é abandonado; então, só e deitado, pensa pela primeira vez; um vago instinto o assalta; como a andorinha advertida da próxima estação, sente que nem tudo está acabado, que vai recomeçar alguma coisa desconhecida. Não é bastante inteligente para supor, temer ou esperar, mas calcula, às pressas, suas vitórias e derrotas; pensa no número de caças que abateu e se regozija ou se aflige conforme os resultados obtidos. Sua mulher — só têm uma por vez, embora possam trocá-las sempre que lhes convêm — agachada à entrada, atira seixos no ar; quando formam um montículo, ela julga que chegou a hora e se aventura a olhar para o interior; se suas previsões se tiverem realizado, se o homem estiver morto, ela entra sem um grito, sem uma lágrima, despoja-o da pele de animais que o envolvem, vai friamente avisar seus vizinhos, que transportam o corpo e o incineram, tão logo esfria.

Os animais, que por toda parte sofrem os reflexos humanos, são mais selvagens, mais cruéis que em qualquer outro lugar. O cão e o lobo são uma só e mesma espécie, incessantemente em luta com o homem, que, contra eles, se entrega a combates encarniçados. Aliás, menos numerosos, menos variados que na Terra, os animais são a miniatura deles mesmos.

Os elementos têm a cólera cega do caos; o mar furioso separa os continentes sem navegação possível; o vento ruge e curva as árvores até o solo; as águas submergem as terras ingratas, que não fecunda; o terreno não oferece as mesmas condições geológicas da Terra; o fogo não o aquece; os vulcões são desconhecidos; as montanhas, pouco elevadas, não oferecem nenhuma beleza; fatigam o olhar e desencorajam a exploração; enfim, por toda parte, monotonia e violência; por toda parte a flor sem cor e sem perfume, por toda parte o homem sem previdência, matando para sobreviver. [Vide: Observações Preliminares.]

Georges.

 

Observação. – Para servir de transição entre o quadro de Marte e o de Júpiter, seria necessário o de um mundo intermediário, da Terra, por exemplo, mas que conhecemos suficientemente. Observando-a, fácil é reconhecer que mais se aproxima de Marte que de Júpiter, posto que, mesmo no seio da própria civilização, ainda se encontram seres tão abjetos e tão desprovidos de sentimentos e de humanidade, vivendo no mais absoluto embrutecimento e não pensando senão em suas necessidades materiais, sem jamais terem voltado o olhar para o céu, que parecem ter vindo diretamente de Marte. [ALLAN KARDEC.]

 


[NOSSAS OBSERVAÇÕES: Aqui faz-se necessário uma análise da mensagem relativa a Marte diante das novas informações que temos a respeito desse orbe. Com a implementação dada pelos Espíritos à obra kardequiana pela mediunidade de Francisco Cândido Xavier, temos notícias de Marte através de duas mensagens, uma de Maria João de Deus, mãe do médium, no livro Cartas de Uma Morta, e outra através de Humberto de Campos no livro Novas Mensagens, ambas deveriam ser lidas por nós para uma justa apreciação do seu conteúdo e da forma como se expressam Maria João de Deus e Humberto de Campos. Comparando-as com a de Georges sobre Marte, não é difícil saber de que lado está a expressão da verdade, pois as informações contidas nas mensagens de Maria João de Deus e Humberto de Campos contradizem formalmente o que este Espírito escreveu sobre o mesmo assunto. Observa-se nele [Georges] seu pouco cuidado em tratar de coisas sérias, senão vejamos:

1.º — “Marte é um planeta inferior à Terra, da qual é grosseiro esboço; não é necessário habitá-lo. Marte é a primeira encarnação dos mais grosseiros demônios.”

Marte é um planeta inferior à Terra” — Não temos notícia a respeito de Marte dada pelos Espíritos a Allan Kardec a não ser aqui, Kardec houvera de publicar na Revista Espírita qualquer outras informações a respeito de Marte assim como as publicou a respeito de Júpiter. Além dessa mensagem de Georges falando de Marte o assunto somente é tratado pelo próprio Codificador na Revista de março de 1858 quando fala, ele próprio, de Júpiter e outros mundos e em uma nota sua à questão n.º 188 do Livro dos Espíritos, portanto, qualquer apreciação a respeito do estado evolutivo desse mundo seria temerária, até então.

Não é necessário habitá-lo.” — Afirmação presunçosa do ponto de vista individual e que coloca em dúvida os desígnios de Deus a respeito dos nossos destinos.

Primeira encarnação dos mais grosseiros demônios” — Sabemos pela Doutrina Espírita que em sua primeira encarnação humana os Espíritos são simples e ignorantes, não podendo portanto serem classificados como “mais grosseiros demônios” pois ainda não puderam adquirir a compreensão do bem nem do mal.

2.º — “Deus tem horror ao mal e só o tolera como servindo de princípio ao bem.” O Espiritismo revela que Deus em sua onisciência criou o homem simples e deu-lhe o livre arbítrio, sabendo que pela má utilização de seu livre arbítrio poderia gerar o mal. Veja-se a questão 630 do Livro dos Espíritos. Essa expressão de Georges mostra bem a transposição que o homem costuma fazer comparando seus pobres sentimentos humanos à expressão do pensamento de Deus.

A comunicação toda revela como que o desejo do romancista em pintar um quadro impressionante em sua obra, mas não o cuidado e a circunspeção dos Espíritos sábios. Konrad Jacques.]


[Vide também pelo mesmo Espírito na Revista de agosto de 1862: O Planeta Vênus.]


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